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quinta-feira, julho 10, 2003

saído diretamente do jarro
 

21:43 HPJ (horário padrão do jarro):

Eu sempre suspeitei, mas de uns meses pra cá tenho me deixado convencer de que é verdade. Algumas pessoas vão achar que estou procurando desculpas para meu fracasso em levar adiante meus projetos, meus estudos e até mesmo meus negócios. Não que eu costume perder meu tempo me preocupando com o que as pessoas pensam. Mas a questão é que eu acredito que se o diagnóstico tivesse sido feito na minha infância, talvez meu histórico de vida fosse bastante diferente.
Desde o início do século 20 a comunidade médica conhece uma disfunção psicológica que afeta a atenção das crianças, sua capacidade de concentração e organização e também o que, nos anos 70 passou a ser descrito por hiperatividade. O problema, no meu caso, é que até o final dos anos 80 os especialistas se focalizaram no lado hiperativo dos pacientes. Somente depois deste período a doença, que passou a se chamar Transtorno de Déficit de Atenção, ou ADD, Attention Deficit Disorder, em inglês, foi separada em dois grupos, os que apresentam e os que não apresentam Hiperatividade e Impulsividade (classificados como ADHD, Attention Deficit and Hyperactivity Disorder). Em 1995 caiu o último tabú, de que o ADD desaparecia no final da adolescência. Hoje sabe-se que de 30% a 60% dos casos de ADD se prolongam por toda a vida.
Eu era uma criança relativamente calma. Nunca fui fã do ar-livre, de brincadeiras físicas, esportes e jogos. Por isso ficava boa parte do tempo lendo as revistas científicas que se empilhavam no revisteiro do banheiro dos meus pais. Minha timidez me manteve longe de formar um grande círculo de amigos e longe do sexo oposto durante boa parte da infância e adolescência. Apesar do desempenho bastante acima da média nas provas, minhas notas eram sempre reduzidas para o patamar da mediocridade porque eu era incapaz de fazer minha lição de casa, trabalhos escolares e atividades em classe. Toda vez que eu pegava um lápis e um caderno na mão invariavelmente começava a desenhar, a escola a quilômetros da minha cabeça. Quase fui reprovado na 5a, 6a e 7a séries.
A mudança de escola me libertou da escravidão da lição de casa. Meu histórico escolar explodiu em notas algumas vezes até 50% maiores do que as dos anos anteriores, agora que a lição de casa não fazia mais parte do cálculo das notas. Infelizmente isto foi visto como um efeito da satisfação com o método liberal de ensino da escola, o que não me ajudou em nada. Minha incapacidade de me concentrar me tornou um alvo fácil para o álcool. Da 8a série em diante eu fumei e bebi todos os fins-de-semana, às vezes até nos dias úteis.
Apesar das altas notas, não passei no vestibular ao final do 3o colegial. Mais adiante, ingressei no curso de Processamento de Dados de uma faculdade pública. Incapaz de me concentrar, o abandonei o curso depois de seis meses. Seis meses de cursinho depois, ingressei em Engenharia Elétrica numa faculdade particular em São Paulo. Viver fora de casa era muito libertador. Ninguém via que eu não fazia os trabalhos da faculdade. Ninguém me cobrava atenção de nada. Minha desatenção com datas de provas só era percebida por mim mesmo. Pagava todas as contas do apartamento com atraso. Minhas notas declinaram rapidamente até que no último semestre que frequentei a faculdade todas as matérias que eu cursava eram dependências.
No ano em que tranquei matrícula me mudei de volta para a casa dos meus pais. Queria abrir um negócio e o dinheiro, ao contrário do normal, estava disponível naquela época. Eu nem parecia eu mesmo: fiz pesquisa de preços, procurei imóveis, mobília, equipamento... Depois da abertura da loja, lá estava eu 6 dias por semana trabalhando sem parar.
Mas minha desatenção para os problemas da firma praticamente destruiram meu sonho de ter meu próprio negócio. Antes que eu devesse dinheiro na praça, prestei vestibular e voltei a estudar. Desta vez, tirei a sorte grande e consegui entrar no curso de Engenharia Mecatrônica da USP, meu objetivo fazia oito anos. Agora, faço um esforço doido para me manter dentro do curso. Mas não quero me manter graças a um esforço sobre-humano. Quero ser normal. Nem que o preço da normalidade seja tomar uma pílula antes de dormir e uma logo ao acordar. Quero levar meu namoro pra frente, quem sabe casar e ter filhos. Quero um dia ser um profissional de sucesso.
Vou consultar um psicólogo e descobrir se eu tenho mesmo ADD Adulta. E vou me tratar. Espero que vocês todos que me assistiram desistir de tanta coisa e deixar tantos projetos inacabados me perdoem algum dia.

Escrito pelo Unknown

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